20.4.12

"Anarquistas"? Então também sou anarquista!


Inimaginável que alguém se junte para intervir num bairro degradado, que dê apoio escolar a crianças e promova um lugar de encontro para os jovens, e um sítio para os idosos.
Inimaginável que o faça sem pedir dinheiro em troca, ou que sugira ao "utente" a conversão a uma religião ou a uma política qualquer.
Inimaginável que o faça sem paternalismos, promovendo que sejam os interessados a decidirem da forma como é gerido o seu espaço.
Inimaginável, também, que organize uma coisa daquelas sem o intuito de a transformar numa IPS, para pedir apoio do Estado e resolver o seu problema de emprego através do subterfúgio dos problemas dos outros.
Inimaginável que a mão que se estende não seja para pedir mas para levantar.
Inimaginável, por fim, que se diga às pessoas que a melhoria da sua condição passa por aquilo que conseguirem fazer juntas.


Inimaginável e ilegal, porque o legal é manter um edifício público vetado ao abandono e ao lixo num bairro que não tem quase nada.
Nada de novo, será sempre ilegal demonstrar que qualquer tipo de organização popular que funcione sem ser na óptica de sacar dinheiro, mesmo "socialmente", não é organização que se apresente perante a democracia "representativa" onde "nós" votamos e "eles" fazem o resto.
Inimaginável e ilegal.

E... ah, pois, e são "anarquistas"... "Ilegais, outra vez, portanto! Quem lhes deu autorização para serem anarquistas, 'anarquizando', com que legitimidade, alguém viu as 5000 mil assinaturas da legalização? Onde está a concordata que lhes dá direito a existir?"
Ou... "esquerdistas" na cabeça dos cuja cabeça só funcionam com partido. "Anarcas?", "do "Bloco?"... uns "betinhos", nos comentários dessolidários nas caixas dos jornais que mal-disfarçam o desejo de estar no papel da polícia... assim, à laia das arroxadas "beneditinas" sobre os Precários...
E o silêncio dos outros da Esquerda bem comportadinha e mais habituada a combater "as desigualdades" na calma dos salões. Gente mundana que não sai do seu mundo de cheira-cus mútuos, quase todos vingando-se da sua juventude.
E os legalistas... Muitos dos que agitam a ilegalidade da ocupação  (porque lhes cheira a Esquerda) fá-lo-iam também contra uma manifestação de oposicionistas soviéticos, se estivessem na União Soviética. Em nome da Ordem, da Legalidade, claro está. Porque em todas as geografias há cão que não se sente cão se não tiver uma coleira ao pescoço, porque só o aconchego da coleira os convence de que não são aquilo que são: ratos que escolhem sistematicamente os gatos para decidirem por eles.
Enfim, tranquilizai-vos, a ordem foi restabelecida e os telejornais digestivos mostram o "rescaldo" e "o dia seguinte" da investida policial que repôs a legalidade do abandono da Escola da Fontinha. A ilegalidade foi vencida, os putos estão na rua outra vez. Nada que vos tire o sono mais ao Sarkozi de trazer por casa que governa o Porto.
Ilegal?!
Só para lembrar a muitos escandalizados que faz 38 anos que se ocuparam casas vazias para sedes de comissões de moradores, para infantários, para fazer alfabetização, para centros de saúde, para clubes de futebol de bairro, e até para sedes de partidos de esquerda (e de direita, lembram-se do tempo em que eram "sociais" e "socialistas"?) e ... E para viver, porque se é ilegal ocupar casas é imoral mantê-las fechadas a degradarem-se com gente a viver na rua.
Então, também não era legal mas foram legalizadas pela necessidade óbvia. De "interesse público", dizia-se sem maiúsculas.
Hoje, "Interesse Público" só os PIN, os tais que atiram sobreiros ao chão. Nem eles ligam à sua legalidade! Nada de novo, porém: aos Jacinto Leite Capelo Rego não se atiça a polícia, gente com penteado regulamentar enfrenta-se com escritórios de advogados. À Escola da Fontinha sucederá quiçá um prédio para "gente de bem" - se conseguirem colocar os outros pobres fora dali para não estragarem a paisagem.

Mas Legal não quer dizer Moral, porque Moral é outra coisa. Não tem a ver com consolo de derrotas. Moral é intemporal, cruza a política e a religião, vive na cabeça e no coração de qualquer Ser Humano a quem a Injustiça repugna. É aquilo que faz alguém desafiar o destino, porque "só os peixes mortos não nadam contra a corrente".
Os putos da Escola da Fontinha eram "anarquistas"? Então também sou anarquista e tenho orgulho nisso!

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